terça-feira, fevereiro 17, 2009

Woodstock Revisited - Richie Havens

Richie Havens
“Pensei: “Meu Deus, eles vão-me matar. Não vou enfrentar o palco sozinho! O quê? Estão malucos?” era uma sexta – feira à tarde, por volta das 15 horas e o concerto estava atrasado quase três horas. Eu deveria ser o quinto na ordem do programa; os outros artistas tinham ficado no hotel a cerca de 11 quilómetros dali. Pensei: “Eles vão atirar-me com latas de cerveja e tudo porque o espectáculo já ultrapassou a hora marcada”. Então, fiz um pouco de conversa mole e estive praticamente três horas sentado até que finalmente alguns dos outros resolveram aparecer.
O meu baixista, Eric Oxendine, tinha sido apanhado pelo trânsito na New York State Thruway. Ele tinha abandonado o carro a cerca de 49 quilómetros e vindo todo esse caminho a pé. Quando chegou, já tínhamos actuado. No momento em que saímos, deixando para trás o festival, não havia na estrada nenhum outro automóvel além do nosso. Havia por volta de 121 quilómetros de carros estacionados em fila. Foi a coisa mais surrealista que jamais vi na minha vida.

A minha recordação mais precisa foi o ter-me apercebido de que o que eu estava a presenciar naquele momento era algo que nunca imaginara: uma assembleia em sintonia. E, acreditem-me, ninguém gostaria de estar num lugar daqueles a abarrotar de gente se não se tratasse de um grande número de pessoas na mesma onda. Foi a expressão primeira da primeira geração unida pelo mesmo objectivo nascida neste planeta. O Live Aid foi um filho de Woodstock, uma criança de Woodstock, a que eu chamei Globalstock.
A história de estarmos todos uns com os outros, numa boa, é interessante. No início, não se tratava apenas da música, mas de algo como “vamos todos para o parque comer guloseimas e estar uns com os outros”. Daí, partiu-se para o Festival Pop de Monterey – um concerto gratuito realizado em 1967 – depois veio a ideia de “tentemos fazer uma coisa destas, mas também ganhar algum dinheiro”. No entanto, isso nunca aconteceu. Woodstock tornou-se no mais universal e no maior momento de confraternização casual a que eu chamo o “Acidente Cósmico”. Totalmente inesperado.

Os organizadores pensaram que se fosse como o Monterey Pop – que reuniu 50 a 60 mil pessoas – eles se encheriam de dinheiro. Contudo, estiveram na primeira tarde do festival cerca de 400 mil pessoas. Se alguém conseguiu um bom lucro foi a Warner Bros., com os direitos de filmagem. O mérito de Woodstock ser amor, paz e harmonia acabou por assentar nos pilares do “vamos ganhar dinheiro”. No princípio foi assim. O conhecimento das coisas veio depois.
O filme registou isso e nem sequer ligou muito à música. Viam-se alguns dos artistas a tocar uma ou outra música, mas nem metade dos que actuaram. Não foi, por isso, uma descrição do que se passou no palco, mas apercebemo-nos do que membros da geração mais velha, como chefes de Polícia que diziam: “Deixem os miúdos em paz, eles são bestiais e não estão a maçar ninguém”. Para as pessoas que estiveram lá, a música não foi o mais importante.

Woodstock não foi só sexo, drogas e rock‘n’roll. Graças a Deus pela música, porque quem a pôde ouvir, apercebeu-se do espírito que uniu toda aquela assembleia, o espírito das pessoas serem apenas pessoas.”
(continua)

11 comentários:

Anónimo disse...

Grande epopéia!Parabéns pela postagem!

conduarte disse...

Muito louco tudo por aqui, terei que voltar com muuuuita calma, mas vim pelo seu comentário no armazém do peri s.c. ! Morri de rir com o que vc falou, "escreveu" sobre a lâmpada caída no chão... Cara, eu ri muito!
Adorei, Bjus CON

roserouge disse...

Eduardo, estou toda contente por vocês estarem a gostar! Tem que chegue até ao fim da semana!

Conceição, bem-vinda por aqui. Mi casa es su casa! Bj

Jorge Pinheiro disse...

Richie...! O homem que tocava só com o polegar da mão esquerda carregando nas cordas e zurzia forte com a palheta na mão direita. Uma figura! Grande história. Estou cheio de inveja... Onde arranjaste isto?

roserouge disse...

Jorge, não leste a primeira parte do primeiro post de ontem...tá lá explicado!

Anónimo disse...

RR
Uma bela e sensível análise essa do Richie Havens.
Li, na época, que ele arrancou os dentes superiores para ...cantar melhor. Muito loucos foram esses tempos.

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Bé, a série está muito boa. O sonho ainda nao acabou!!!

No Brasil tivemos o Rock in Rio que foi uma loucuuuuuuuuuuuura!!!

Abrcaos

roserouge disse...

Peristock: arrancou os dentes de cima? rsrsrsr...o Marilyn Manson também mandou tirar as costelas flutuantes para se poder dobrar para a frente e...bom, deixa pra lá...

Georgia: nós cá também temos Rock In Rio de dois em dois anos...

Jorge Pinheiro disse...

OK. Já percebi a origem. É sempre bom guardar as coisas de que gostamos.

Unknown disse...

Vi o Richie Havens nos anos 80 em Setúbal num festival estranho. Acho que foi o único. Tocou como ninguém. Como estava longe, fui-me aproximando lentamente do palco, fugindo aos diversos seguranças que não deixavam ninguém passar. Acabei por ver o concerto muito perto dele. Aí reparei que o Richie Havens não tinha os dentes de cima. Meteu-me impressão. Afastei-me e fui para uma barraca de cerveja. Lá longe, acabei por gostar mais do festival.

roserouge disse...

LOL! Que cena! Às vezes é melhor ficar na dúvida do que ter a certeza! E ao menos, lá longe não vês misérias!