sexta-feira, abril 03, 2009

Pulp Fiction

Maria! Não Me Mates Que Sou Tua Mãe! narra um crime bárbaro ocorrido em Lisboa, em Setembro de 1848. Trata-se de uma filha que mata a própria mãe, apenas para a roubar. Camilo edita o folheto em dezasseis páginas, em regime de anonimato. Considera-se esta narrativa no âmbito da literatura de cordel, recorrendo ao sensacionalismo. Obteve grande êxito junto das camadas populares, sendo um dos primeiros textos de Camilo a pertencer a este género literário. Meditação sobre o espantoso crime acontecido em Lisboa: uma filha que mata e despedaça sua mãe. Mandada imprimir por um mendigo, que foi lançado fora do seu convento e anda pedindo esmola pelas portas. Oferecida aos pais de famílias, e àqueles que acreditam em Deus!

PAIS DE FAMÍLIAS!
Atendei e vereis o maior de quantos crimes se tem visto no mundo! Vereis uma filha matar sua mãe, porque esta não lhe deixava fazer tudo quanto desejava.
Vereis como essa filha corta a cabeça de sua mãe, e os braços, e as pernas, e vai pôr cada pedaço de corpo de sua mãe em diferentes lugares, para que ninguém conhecesse o cadáver da morta, nem a mão que a matara e despedaçara. Vereis como a matadora de sua mãe, de sua mãe ó pais de famílias, de sua mãe, que a trouxera nas entranhas, que lhe dera o alimento dos seus peitos, que a criara ao seu lado com beijos e afagos, que tirara o pão de sua boca para o dar à sua filha, que fora talvez pedir uma esmola para que a sua filha não tivesse fome e não desse seu corpo em troca de um bocado de pão! Vereis como esta filha sem alma, sem medo de Deus, sem temor das penas do inferno, é descoberta como matadora de sua mãe, por um milagre, pela providência de Deus! Vereis aquela mulher com alma de tigre comer com toda a vontade e contentamento, ao pé da cabeça ensanguentada de sua mãe e responder quando lhe perguntaram se é aquela a cabeça de sua mãe.
- Sim! - disse ela - essa é a cabeça de minha mãe!
E continuou a comer.
Pais de famílias! Eu vou contar-vos o mais triste e espantoso acontecimento que viu o mundo, e que talvez não torne a ver. Chamai os vossos filhos para junto de vós. Lede-lhe esta história e fazei que eles a decorem, que a tragam consigo e que a repitam uns aos outros.
Pais de famílias! O que escreveu estas linhas com o seu pouco saber talvez vos terá ido à porta mendigar as migalhas da vossa mesa.
Deus Nosso Senhor Jesus Cristo permita que eu possa levar a compaixão ao coração dos que me lerem, que eu desgraçado pecador fico pedindo a Deus pela alma daquelas infelizes mãe e filha.
Maria! Não me mates que sou tua mãe! - Camilo Castelo Branco
(continua)

3 comentários:

Gustavo disse...

Estou absurdado.

até difícil mandar beijos...
beijo,

GuS

Jorge Pinheiro disse...

O máximo. Melhor que as telenovelas brasileiros. Este Camilo era muito avançado!

roserouge disse...

Absurdado? Gosto desse palavrão, está em consonância com o texto..rsrs

E o Camilo era completamente louco, tivemos por cá umas figurinhas bem doidas no século XIX...hoje em dia...é melhor estar calada...