O seu livro, "Rock Roadie", começa por dizer: "Se te lembras dos anos 60, é porque não viveste nos anos 60".
Sim, costuma dizer-se isso porque estava toda a gente sobre o efeito de drogas! Eu tentei manter-me fora disso, também nunca bebi, até hoje. Sou talvez a única pessoa de Newcastle que não bebe. Se tivesse feito isso, não tinha corrido bem, porque não me ia levantar de manhã para garantir que os músicos se levantavam de manhã.
E assim também mantém a memória de todas estas histórias que conta no seu livro.
É verdade. Mas um roadie, naqueles anos, não era muito valorizado. Só alguns anos mais tarde é que se percebeu que eram os roadies que mantinham os grupos unidos, que os tiravam da cama, metiam nas carrinhas, nos autocarros ou levavam ao aeroporto.
Achei interessante a sua definição de roadie: um músico falhado.
(risos) É verdade. Fui músico, toquei num grupo, os Wildcats, e não era mau. Mas não era bom o suficiente. Mas a maioria dos roadies com quem eu falo, por exemplo o Ian Stewart, dos Rolling Stones, era teclista, mas não era bom o suficiente. E por isso, tal como a maioria dos roadies que conheço, somos todos uns falhados, então fizemos o que mais gostávamos.
Exacto. Os Animals tinham uma audição para ir, mas não tinham o equipamento suficiente. Os Wildcats tocavam com os Animals e, por acaso, eu tinha muito equipamento: amplificadores e tudo mais. E também tinha uma carrinha e eles não. Então emprestei-lhes o equipamento e conduzi-os até Londres para a audição na carrinha. Passaram, conseguiram o contrato e tudo mais, e convidaram-me para ser o roadie. Foi assim que comecei.
Foi uma mistura de sorte – de estar no lugar certo – e ter o equipamento.
Exactamente!
Quais são as características de um bom roadie?
Tem de saber o que está a fazer. Eu tinha sido músico e percebia de amplificação dos instrumentos, de como é que as coisas funcionavam. Podia afinar guitarras, por exemplo, montar baterias. Isso é indispensável, para que quando as bandas cheguem ao palco comecem logo a tocar.
Mas os roadies não eram também seduzidos pelo sexo, drogas e rock and roll?
Bem, sexo sim! (risos) Tinha 19 anos, então?! 19 e adorava mulheres. O rock and roll também, mas drogas não. Há uma coisa muito importante nos anos 60: os roadies, a banda e o equipamento andava tudo só numa carrinha! Agora não, há 15 camiões, helicópteros, cozinheiros pessoais: não é rock and roll, são uns "pussycats".
Mas os Stones, por exemplo, são dos maiores de sempre e têm toda essa parafernália.
São os melhores, mas até eles te podem dizer que preferiam o passado, quando iam tocar a pequenos clubes. Já li isso em muitas entrevistas. É a diferença dos roadies dos anos 60 para os de hoje: antes era só um, hoje são 200.
Trabalhou com muitos artistas, mas pode dizer-me qual é aquele que foi o mais difícil de trabalhar?
Bem... talvez os The Animals, porque andavam sempre à porrada. O Eric Burdon talvez seja o melhor vocalista branco de blues de sempre, mas provocava, era mauzinho. E costumava lutar com o Chas Chandler, que tinha 1,93m! Eu tinha de me meter no meio deles. Até quando fizeram uma reunião em 1993, ao fim de 30 anos, e ainda lutavam! Acontece em muitos grupos, mesmo hoje.
Sim, muito, muito mesmo. Desde que déssemos ao Jimi uma garrafa de vinho, uma guitarra e uma mulher... ele estava bem! Os primeiro anos, em Londres, quando estive com ele, foi quando ele estava melhor: portava-se bem, porque queria ser uma estrela pop, e tomava atenção às pessoas. Depois fizemos o concerto de Monterey... vieram as drogas, e quando ele começou a tomá-las – e tomava muitas – ele mudou: tornou-se esquisito, ia para o estúdio com 20 groupies, que se se sentavam na cadeira de produtor... parecia que cada noite eram elas que mudavam as gravações daquilo que ele tinha feito durante o dia. Tornou-se uma pessoa esquisita para trabalhar e, além disso, não queria trabalhar.
Mas acha que foi o espectáculo que Monterey que o mudou?
Foi esse concerto que o tornou famoso nos EUA.
Foi a fama que o mudou.
Sim. Foi um concerto incrível. Os The Who também estavam lá e o Pete Townshend chegou-se ao pé dele e disse: “Acho que deves ser tu a terminar o concerto e não os The Who... não podemos ir a seguir a ti...” O Jimi disse que sim, porque era muito tímido. A loucura do Pete levou-o a partir a guitarra. O Jimi disse-me: “Merda! Aquilo é o que eu faço!” Ele teve de fazer algo, então pediu para ir buscar gasolina. E assim foi... Ele fez a “Wild Thing” e incendiou a guitarra! Nunca ninguém tinha visto aquilo! Acho que foi o melhor espectáculo que ele fez.
Foi o mais memorável?
Sem dúvida. As pessoas falam de Woodstock, mas esse foi terrível! Havia seis gajos em palco... ele deveria ter tocado no domingo à noite, mas a chuva adiou o concerto, não havia electricidade. Então tocou na segunda-feira de manhã. E o meio milhão de pessoas que lá estava já tinha ido para casa. Ainda havia 20 mil... mas é uma diferença enorme. O melhor foi ele a tocar a "Star Spangled Banner". Mas foi o de Monterey foi o melhor. Em 68 começou as digressões pelos EUA, apareciam pessoas para lhe dar drogas. O problema do Jimi é que ele não conseguia dizer que não.
O Tappy também foi amigo do Mitch Mitchell, o baterista, até à altura da morte dele, há dois anos?
Falámos aqui e acolá. Mas não sei bem... nem sei bem onde está o meu irmão! (risos)
Sabia da existência do disco que foi lançado, “Valleys Of Neptune”?
Só há pouco tempo... é de originais?
São músicas não editadas até hoje. Mas ao que parece o tema "Valleys Of Neptune" era desconhecido.
Não sei onde foram buscar esses temas... Devem estar à procura de algo desesperadamente. Só conhecia o álbum em que ele toca temas blues. Mas esses são temas novos ou é só uma canção?
(risos) Bem, não sei onde foram buscar. Mas acho que são coisas que o Jimi não quereria que fossem mostradas. Deve ser de alturas em que ele ia para estúdio, com a guitarra, brincar... Mas olha, já sei... deve ter sido no período pós "Electric Ladyland". Ele ia para estúdio, a noite toda, e tocava tudo: guitarra, bateria... e ia experimentar. Mas tenho de ser muito honesto: porque é que se espera até 2010 para editar uma coisa que já está gravada há tanto tempo? Julgava que já não havia mais nada... e eu era muito próximo do Jimi!
No seu livro fala também de Mike Jefferey, o agente de Jimi Hendrix, e da revelação que ele lhe fez, de que teria sido ele o responsável pela morte do Jimi. Pediu-lhe para fazer uma promessa de silêncio. Como se sentiu ao ouvir tal confissão?
Eu trabalhei com o Mike Jefferey desde os Animals. Era tão próximo que estava à espera dele no aeroporto quando o avião dele se despenhou... Fiquei chocado com essa revelação, mas não surpreendido, porque sabia do que ele era capaz. Ele estava a dever dinheiro à mafia e isso é algo perigoso, sobretudo quando não podia pagar. É a velha expressão de matar ou morrer... ele teria ficado na bancarrota se o Jimi o tivesse abandonado, coisa que já era comentada... Se isso acontecesse, o Mike Jefferey teria sido morto pela máfia. Eu não queria que ele me tivesse contado aquilo. Mas sabes, quando as pessoas fazem este tipo de coisas, têm de as tirar do peito, de contar a alguém. Basta ver que ele estava cheio de dívidas e quando o Jimi morreu... pagou-as todas!
Bem, isso vem do trabalho que eu fiz com o Peter Noone, dos Herman's Hermit. Eu era agente dele e ele era enorme nos EUA: vendeu mais discos em 1965 do que os Beatles... Bom estávamos no Hawai e muito cansados e eu pedi à recepcionista para não me passar qualquer telefonema! Tinha-me deitado há dez minutos quando o telefone tocou. Quando atendi ouvi do outro lado (imita voz grave) “Olá daqui fala Elvis Presley”. O que dizer? Mandei-o passear, disse-lhe "fuck off"... Desci e passei-me com a recepcionista: "Acabei de receber um telefonema de um palhaço a dizer que era o Elvis!" E ela: "Desculpe, mas era mesmo o Elvis Presley. Ele está cá no hotel e quer que amanhã o senhor passe pelo estúdio dele..." Bom, lá telefonei de volta, pedi desculpa e tornámo-nos amigos, fiz alguns concertos com ele, mas estava muito comprometido com outras coisas.
Como era Elvis Presley?
Era muito generoso. Costumava chamar-me “sir”. Ele era um cavalheiro, profundo! Era tão simpático que não tenho nada de mal a dizer dele.
Há alguma banda com quem gostaria de ter trabalhado?
Bom... não sei... foram tantos. Fiz umas coisas pequenas com os Rolling Stones, com os Beatles – que tivemos de tirá-los de um edifício. Eu conheci-os a todos, porque era um meio pequeno. Mas olha, tinha adorado trabalhar com o Frank Sinatra. Era o meu tipo de pessoa.
Foi com a Tina Turner. Fantástica! O Ike era assustador... a mim pregava-me cagaços. Mas ela gostava muito de ir às compras, aos mercados... eu levava-a a todo o lado e era muito simpática. Mas quando subia ao palco... era fenomenal. Nunca me cansei de a ver.
Retirou-se em 1984. O que tem feito desde então?
Tenho vendido “memorabilia”. As pessoas vêm ter comigo para ter opiniões sobre material a comprar, etc. Também trabalhei com algumas estrelas de cinema: o Steven Seagal, por exemplo, queria uma guitarra igual à do Jimi, mas não sabia se era semelhante ou não. No fim dos anos 90 comecei a escrever o livro. E teve de ser escrito com muito cuidado, porque hoje em dia os fãs, com a internet, confirmam tudo: até a cor da t-shirt que os artistas vestiam em 1970. E teve de ser tudo muito preciso.
Entrevista ao jornal Metro - 9/Março/2010
3 comentários:
Gostei de saber tanta coisa!
Obrigado, RR.
Um beijo.
Parece interessante. Podes-me dar nos anos.
Consegues esperar até lá? Ainda faltam uns meses...
Enviar um comentário