quarta-feira, março 24, 2010

A Solução Final

"Si vous êtes né dans un pays ou à une époque où non seulement personne ne vient tuer votre femme, vos enfants, mais où personne ne vient vous demander de tuer les femmes et les enfants des autres, bénissez Dieu et allez en paix."
Les Bienveillantes - Jonathan Littell


"A cultura não nos protege de coisa nenhuma. Os nazis são a prova disso. Pode sentir-se profunda admiração por Beethoven ou Mozart e ler o "Fausto" de Goethe e ser-se uma porcaria de ser humano.
(...) O que pretendo demostrar de todas as formas, com uma personagem como Max, é que também num período da História, aliar-se aos nazis, foi para muita gente uma opção ética. Não se trata de ter escolhido ficar do lado dos maus. (...) Os que escolheram os nazis fizeram-no conscientes de que tomavam um caminho para eles ético, cujos erros ou imperfeições deviam ser melhorados.
(...) Continua a ser para mim um mistério. O facto de se organizarem assassinatos maciços, o facto de que uma pessoa possa matar outra, é que acho estranho, raro, que enquanto aqui estamos alguém possa estar a torturar, num qualquer sotão, um ser humano.
(...) parece-me estranho que na cabeça dessa gente possa caber a possibilidade de amar os filhos, a familia e ao mesmo tempo torturar os seus semelhantes ou filhos de outros. Tentei analisar e ver através dos olhos de Max (...)
Jonathan Littel - entrevista no suplemento Ípsilon do jornal Público de 28 Dezembro 2007.
"(…) as únicas coisas indispensáveis à vida humana são o ar, o comer, o beber e a excreção e a busca da verdade. O resto é facultativo."

Com um narrador ex-oficial e bissexual, o escritor Jonathan Littel desvenda as origens apocalípticas do Mal.
Depois de arrebatar o principal prêmio literário francês, o Goncourt, e o Grand Prix du Roman de l'Académie Française, em 2006, o primeiro livro de Jonathan Littell chegou a Portugal em Dezembro de 2007, pela editora Dom Quixote. Na capa do calhamaço, cuja narrativa conta com 895 páginas, vem estampado o título: As Benevolentes, - uma referência à tragédia grega de Ésquilo - personagens da mitologia grega, também conhecidas como "Erínias" ou "Eumênides", deusas perseguidoras, vingadoras e secretas.
Filho do ex-jornalista e escritor de thrillers, Robert Littell, Jonathan nasceu nos Estados Unidos, ganhou cidadania francesa e, agora, vive em Barcelona. Estudou em Yale, viu de perto os dramas da Bósnia, Tchetchénia e Congo, regiões devastadas por guerras civis. Em 2001, abandonou o activismo humanitário, dedicando-se exclusivamente à pesquisa que resultou em Les Bienveillantes.
Apesar da origem ianque, o ex-activista deu à narrativa o idioma francês, justificando-se por ter os franceses Gustave Flaubert e Stendhal como heróis literários. Como o americano Philip Roth, Jonathan esmiuça os meandros do realismo histórico, emprestando seu ponto de vista, a partir das experiências na Bósnia. Entretanto, sem distorcer o referencial pragmático dos factos, transforma num romance, os relatos de um oficial do exército nazi.
Jonathan dá voz ao Rottenführer do exército nazi, Maximillian Aue, deixando-o relatar atrocidades nos frentes de Estalinegrado, passando por Berlim até a Lituânia. No livro, surgem personagens reais como Adolf Hitler, Albert Speer e Rudolf Hess. A narrativa também chega ao gabinete de Heinrich Himmler, um dos responsáveis pela “solução final”, cujo objetivo era eliminar os judeus da Terra.
Porque, segundo eles, se tratava duma "questão de higiene política". O objectivo de Jonathan é, sem dúvida, perseguir a origem do mal, descontando na humanidade a responsabilidade pelo extermínio de milhões de judeus. Nesse sentido, aparecem as contribuições da Ucrânia à política nazi e de outros países. Fixando o enredo, o escritor também explicita a hipocrisia nazi quando propõe um narrador bissexual e ex-oficial das SS.


"Estávamos ali a matar o tempo, antes que o tempo nos mate a nós."

7 comentários:

João Menéres disse...

Como é que me escapou esta tua postagem de4ª feira?
Tens a certeza que a botaste nesse dia?

Um beijo "absolutely", RR.

El Matador disse...

Ando há mais de 3 quinze dias para ler este livro.

roserouge disse...

João: comecei a fazer o rascunho na 4ª feira, mas só pus ontem. Não percebo como saíu com data de 24...

El Matador: comecei a lê-lo há mais de um ano. É muito pesado, uma chatice. Mas é fenomenal, um verdadeiro soco no estômago. Para Max, toda a gente foi responsável e teve culpa do escalar do nacional-socialismo. Brutal.

João Menéres disse...

RR

Fico mais sossegado!
Os neurónios não estão tão malzinhos quanto eu já temia...

Anónimo disse...

Li-o todo de seguida, o que não foi fácil,mas valeu a pena. Foi o livro que mais me perturbou nos últimos anos. Uma obra prima
Ortega (esqueci-me da password)

Alexandre Kovacs disse...

Um livro difícil de se ler e talvez ainda mais difícil de se escrever, mas achei importante como documento histórico e ficção. Publiquei uma resenha lá no meu mundo, se tiver tempo visite-me seria um prazer receber o seu comentário.

roserouge disse...

Olá, Ortega, há qto tempo! É de facto um livro bastante perturbador. Quase que sentimos simpatia pelos nazis, pela forma como ele responsabiliza toda a gente, desde o padeiro ao general de 5 estrelas.

Kovacs, tudo bom? Passarei por lá mais tarde, obrigada pela visita!